13

Sim, sim, caro leitor inexistente. Chegamos ao treze. Superstição e idiotice. Ênfase, por favor, na idiotice. Como poderia eu, por um segundo sequer, ter me atrevido ao devaneio de que desta vez algo sorriria para mim? Vivo me enganando, sempre com a cega esperança de que o treze nunca vai chegar, nunca me alcançaria, pensava eu. Mas nada que existe me escapa. E hoje, aqui sozinho nesse quarto pálido, sinto encravando-me as unhas na pele a crua existência de tudo e ao mesmo tempo de nada. A nojenta, maldita, repugnante às vezes. Prostituta que em meus sonhos é donzela, sonhos meus também malditos. Culpa é primeira infância que nunca há de se conformar. Parece que não tenho memória. Ingenuidade traidora!
Ao menos, pensando bem, não tenho memória racional. Meu cérebro registra sensações, enquanto as imagens nítidas e as informações ficam embaçadas, bem no fundo, insignificantes. Mal aparecem quando fecho os olhos. Só me vem o arrepio de volta, a vontade, o instinto despertado por uma experiência rotineira qualquer. E depois aquela felicidade imbecil, por ter relembrado algo ocorrido apenas dentro da minha mente, cuja realidade cínica é tão bem representada que na maioria das vezes até caio nessas minhas brincadeiras de criança sozinha no mundo.
Parabéns, seu idiota. Isso, isso mesmo, perca mais 20 anos da sua vida deste mesmo modo. Continue brincando com esse fogo de que você gosta tanto, mesmo sabendo que pouco - quase nada - resta de suas mãos cheias de bolhas, em carne viva, latejando e ardendo. Continue, veja até onde chega e depois me conte. Sim, depois me conte, pois cansei de ser sua consciência. Abandonar-lhe-ei por alguns instantes. Só comprei passagem de ida. Quem sabe um dia você não tenta procurar por onde ando. Afinal, a esperança não é mesmo a última que morre? Espero estar muito bem morta antes disso.

12

Argh. Finalmente vieram até mim, de má vontade, algumas palavras. Elas estão cada vez mais arrogantes, frias, ausentes. Nem me dão mais atenção. Vou me aproveitar deste raro momento em que elas me dão uma chance, vou aproveitar como se fosse a última. Estou em cativeiro, mas não há ninguém eternamente responsável por mim.
Passemos ao mundo de fora; minha vida pessoal não existe neste torturante e interminável momento.
Não costumo escrever sobre escritos. Aliás, até que o faço de quando em vez, mas não tão especificamente como o farei agora. Não é uma análise; apenas se trata de pensamentos jogados ao nada. Quem queira, que os apanhe de bom grado. Contente fico. Aí vai, perdoar-me-ão o fictício leitor e o real também - se aí estiver, em algum canto - os erros de português ou de raciocínio.
Se eu tivesse facilidade para chorar, com certeza teria chorado muito nesta leitura. Acho que chorei por dentro. É impressionante como um texto pode conter características tão conflitantes... É tão ingênuo, inocente e ao mesmo tempo tão autoconsciente, cheio de intenção, que dá ao leitor uma felicidade estranha. Não é nada eufórica, é uma felicidade muda, complacente, contida... Não vibra, apenas admira.
Palavras simples e mais plenas de conteúdo e de verdade - ou tão plenas quanto - que qualquer escritura canonizada, qualquer texto acadêmico. É um texto que nos faz acordar, por um segundo. Pena que, para certas coisas, a memória humana é bem fraca. Concordo com o autor e com a personagem - as pessoas grandes são realmente muito estranhas. Tenho medo de um dia ser grande por dentro, também.
Se é possível resumir em uma palavra a sensação que este texto me passou, com certeza diria: melancolia. Até os ossos. Cada palavra está encharcada de melancolia, esta mistura de tristeza e felicidade que às vezes é tão gostosa, e outras tão terrível. Uma energia que luta para não se conformar com o atual estado das coisas, mesmo com quase certeza de que será esmagada pelo mundo. Desistir, jamais.
Não sei se este texto teria um fim. Apesar de o sentimento em questão ser relativamente raro hoje, ainda é universal. Nunca vai se extingüir de todo. Só sei que o autor deste livro se aproxima daquilo que eu chamaria de gênio. Não criou nenhuma invenção, não escreveu nenhum tratado ininteligível de seiscentas páginas; enfim, apenas viveu normalmente, coisa que nos esquecemos de fazer. Pois o ser "humano" está sempre muito ocupado em tentar aparecer, ficar de algum modo em evidência.
Aquele a quem me refiro não é um gênio da literatura, nem da pintura. Seus desenhos são simples, assim como o são as suas frases. A genialidade está na sua sinceridade, sua aparente humildade para com o mundo; para quem tiver vinte minutos de seu dia destinados a dar atenção ao que ele tem a dizer. É tão simples que dá aflição. Tudo se resume em nós apenas darmos uma chance, não importa a que... Estou falando demais.
Não há conclusão. Como diria o poeta cujo túmulo é coberto de beijos, não sou jovem o suficiente para saber tudo.