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– E se vistas por trás de uma janela com vidro embaçado, as ruas se-lhe tornam mais analógicas, é porque você tem medo de se deixar viver pela pele, de se deixar comunicar por pulmões transpirantes e porosos, desbloqueados por qualquer obsessão. Acompanhar o ritmo dos outros pode, sim, ser saudável e prazeroso como ocupar o banco de trás de um carro num dia chuvoso em que você olha pela janela com vidro embaçado. Mas o pescoço se curva, a coluna-chicote estala-estrala, e você volta a caminhar na calçada, desviando de psicopatas e bostas de mendigo ou cachorro diluídas pela água da chuva. Realmente, não fez diferença você ter saído naquele dia, como se conviver com pessoas e querer transar com pessoas fosse algo longe – até absurdo, você diria, talvez – do que você considera uma atitude normal de um dia estimulante e feliz. Você se sente impelido pela necessidade dos outros, isso eu não posso julgar, mas retornamos novamente à conversa do carro. Se não aguenta a autonomia de andar e é humilhante demais ser dirigido, use uma bicicleta então – você se guia aos lugares pagando o justo preço do esforço do seu corpo. Acho super adequado, digno mesmo.